Mulheres Caboclas Na Guerra Do Contestado

25/06/2020 14:47

A Guerra do Contestado traz consigo uma trajetória muito importante marcada por mulheres caboclas que defenderam suas terras, seja em atos de guerra, benzendo povos, cuidando dos lares e até mesmo por vidências. De certa forma, todas tiveram papéis fundamentais e merecem o devido reconhecimento na história. Por ser considerada uma guerra santa devido ao messianismo e o fanatismo religioso, algumas mulheres consideradas ‘‘virgens’’ pelas lideranças dos redutos e pelo Monge José Maria, possuíam grande influência sobre o povo sertanejo. Estas mulheres seguiam com o monge praticando benzeduras, vidências e auxiliando nas rezas.

As mulheres eram consideradas ‘‘virgens’’ quando se destacando na pureza da alma e não necessariamente virgens biologicamente, até porque havia entre elas mulheres casadas. Porém as que mais se destacavam eram as adolescentes. Dentre as mulheres que ganharam maior destaque por seus atos estão: Maria Rosa, Chica Pelega, Nega Jacinta e a virgem Teodora, cada qual com suas particularidades e histórias.

Maria Rosa foi a figura feminina de maior destaque na época dos redutos, devido às suas qualidades atribuídas como comandante e vidente. Aos 15 anos, discursava com o monge José Maria em meio a orações. Em transes, tinha visões de batalhas Devido a esses fatos, ela era quem organizava o comportamento do grupo através das ordens recebidas pelo espírito do monge. No ano de 1913, Maria Rosa se tornou a chefe militar comandando a retirada estratégica para o novo reduto de Caraguatá, após a primeira batalha em Taquaruçu.

Comandava não só o reduto em que morava como também redutos próximos por meio de expedições, designando quem seriam seus comandantes. Diferenciou-se das outras tantas pela liderança, como guerreira, santa, líder, heroína e guia de povos caboclos, devendo ser historicamente lembrada por sua dedicação ao Contestado.

Imagem de Maria Rosa

 

Outra grande influenciadora na história foi Chica Pelega, que desde pequena demonstrava habilidades com ervas e com cuidados de animais. Tais habilidades eram entendidas como dons concedidos pelo monge. A história relata que sua família veio do Rio Grande do Sul e que a mãe de Chica não conseguia engravidar por motivos desconhecidos, até que seu pai encontra cinzas que supostamente eram de uma fogueira feita pelo monge João Maria, e com a cinza coseu duas trouxas de pano fazendo dois amuletos, um para ele e um para Chiquinha, mãe de Chica Pelega. Depois disso, até as colheitas melhoraram muito, ambos multiplicaram-se na fé e Chiquinha conseguiu engravidar.

Devido a este fato que se deu tanta relação entre Chica Pelega e o monge. Após o trágico episódio de ver seu pai, seu tio e a família de seu futuro noivo todos mortos por jagunços, Francisca Roberta (Acredita-se ser este o nome verdadeiro de Chica Pelega) e sua mãe vão até Taquaruçu. Logo Chica ganhou admiração por cuidar de doentes e crianças. Após anos de muita luta em busca de justiça, Chica Pelega morre em um conflito contra tropas do governo que atacaram os redutos de Taquaruçu.

Já Nega Jacinta era conhecida e denominada como santa por cuidar de doentes, fazer partos, rezas e benzeduras. Não se tem muitos registros bibliográficos, mas pelo que se sabe ela residia em uma gruta hoje conhecida como Santa Emídia, localidade do Rio do Tigre, cidade de Três Barras – SC. Conta-se que neste mesmo local ela abrigou o monge João Maria d’Agostini, tornando assim um local muito procurado por fiéis. Tornou-se digna de respeito e admiração pelos cuidados com as pessoas, marcando presença na história da guerra.

Outra figura feminina que ganhou grande destaque foi a Virgem Teodora, conhecida pelos caboclos por suas visões, que davam esperança à população. Repassava aos caboclos ordens dadas pelo monge em suas visões, e os mesmos com muita fé obedeciam com muita esperança. Teodora era discípula de Chica Pelega, o que também contribuiu no aumento de sua reputação. Entre as mulheres que se destacaram, foi a única com que se teve contato para pesquisas e entrevistas.

Ao ser entrevistada por Mauricio Vinhas de Queiros, Teodora afirma que as visões que tinha do monge não passavam de invenções de seu avô Eusébio e de outras lideranças que faziam isto como forma de convencer o povo, legitimar suas decisões e dirigi-los. Teodora casou-se duas vezes, teve oito filhos e por fim no ano de 1979 veio a falecer aos 78 anos na cidade de Curitiba – PR.

Imagem Virgem Teodora

 

Texto por Alexandre Lima de Oliveira.

Referências 

GRIMES, Suelen Ramos. Jornalismo e questões de gênero: um olhar sobre a invisibilidade das mulheres na guerra do contestado. p 11-57, Criciúma, 2016.  Disponível em: <http://site.satc.edu.br/admin/arquivos/30070/Seuelen_Grimes.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2020.

TRENTO, Aline Eloíse, et al. Guerreiras imortais do contestado, as que tudo viam e faziam durante a guerra de extermínio. p 276-290, Londrina, 2014. Disponível em: <http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/view/20295>. Acesso em: 25 jun. 2020.

Guerra do Contestado. Os reflexos cem anos depois. Entrevista especial com Paulo Pinheiro Machado. Instituto Humanitas Unissinos, 2012. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/514385-guerra-do-contestado-os-reflexos-cem-anos-depois-entrevista-especial-com-paulo-pinheiro-machado> Acesso em: 23 jun. 2020.